segunda-feira, 3 de outubro de 2011

"Quando olhaste bem nos olhos meus e teu olhar era de adeus..."

Dia dos pais.
Lá fui eu, para o momento, até então, mais triste da minha trintífera vida. Estava adiando o encontro há uma ou duas semanas, mas eu sabia - todo mundo sabia - que o Vô estava despedindo-se das pessoas, para poder despedir-se do mundo.
No dia do meu aniversário ele ligou para minha mãe, disse que precisava muito falar comigo; liguei e informei que, ao contrário do que estava me solicitando, iria visitá-lo somente amanhã. Não muito contente, mas conformado. Bom, e o que mais ele poderia fazer?
E lá estava eu, para a derradeira visita. Coragem. Entrei no quarto e vi um rascunho do que fora meu Vô, agora um idoso debilitado física e emocionalmente. Pegou na minha mão e assim ficamos conversando: queria me perguntar se eu sabia de algo para curar o frio que ele sentia por dentro, frio esse que não havia estufa no mundo que pudesse sanar. Não, Vô, não sei...
Lembrei de uma notícia sobre Brasília, de inscritos achados no Palácio do Planalto, feitos pelos candangos que construíram a capital. Ele era iluminador de teatro, e referia-se aos seus ajudantes braçais como "aqueles candangos"+algum adjetivo não muito simpático. Quando comentei, rindo, que eles estavam tratando tais escritos como pinturas rupestres e ele concordou que sim, eram importantes, vi que ele estava mal.
Nisso perguntou se já havia me contado uma história sobre uma ministra, que recebera em Canela, que orgulhou-se em dizer que era candanga, sem saber do significado por aqui. Penso até que sim, mas ouvi de todo o coração, sabia que seria a última história. "Esse teu Vô tem história, não?", me disse, segurando ainda a minha mão.
Foi uma boa deixa para a nossa despedida. Dei-lhe um beijo carinhoso na testa e ele, com os olhos, me disse adeus.
Eventualmente ainda me pego pensando em comentar algo com ele, sobre algum espetáculo, ou esperando um Celta vermelho parar no portão da casa da minha mãe, com o meu Negão querido saindo de dentro, olhando meu cabelo e dizendo "mas inventa moda essa criôla!", dando aquela sonora gargalhada e me achando magra (no auge do meu peso!).
Tua luz faz muita falta por aqui, Vô.

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